A lua da Rita
Um dia a Rita soube da Lua. Inaugurou o disco inteiro de luz, ainda pequena, pouco mais que bebé, num passeio em noite de verão.
A cadeira em que passeava recostava-a, as guardas laterais obrigavam-na ao alto. e o céu noturno depressa tomou conta do olhar.
Já dizia, mas faltavam-lhe ainda as palavras que traduzissem o céu.
Leu-o primeiro na mudez do luminoso espanto; fez da etérea grandeza um embrião à sua medida; acomodou-o no ainda sóbrio espaço das revelações e talvez tenha esboçado o caminho para onírica viagem.
A Rita continuou os passeios que a noite convidava. Perguntava o desconhecimento, queria saber das evidências que o olhar elegia, e fez do céu noturno um mistério que a ingénua condição queria revelado.
De entre a luzente amostra, a lua voltou ao olhar, repleta, agora sem surpresa. O balão, enorme, parecia-lhe ainda maior.
Como todas as crianças, a Rita adorava balões; fascinava-a a sua leveza; a diversidade das suas cores; gostava de jogar com eles ao balão fugidio, e com eles fazer do aniversário uma festa ainda mais bonita.
Diante de si tinha um balão que parecia mirá-la. Quase que jurava que eram olhos o que ela via no lugar onde eles deviam estar se o fossem.
Ás vezes pareciam amistosos, como se a quisessem convidar a entrar num qualquer jogo. Noutras já não era tanto assim, e a sua expressão amedrontava-a.
Não sabia o que dizer, não sabia o que fazer, mas isso não impedia o enlevo da luz que, vendo bem, dominava e reinava sobre todas as outras.
A visão mais atenta, concedeu-lhe todavia um pormenor que se esquivara. Havia mais qualquer coisa para além da luz:
-As zonas de sombra mais ou menos evidentes, e que fizeram supor o olhar que a miraria, existiam um pouco por toda a superfície lunar.
Afinal, os olhos que à quase jura pareciam, eram mesmo, e amistosos convidaram-na sem reservas, ao jogo das descobertas.
Começou aí o desafio das figuras sem fim que o olhar desvendou no círculo luminoso.
Desde os animais que a razoável colecção de peluches explicava, aos brinquedos e objectos do seu uso, ali residiam quase todos os vultos do seu pequenino universo.
Improvável, o jogo prosseguiu até ao tempo da criança, traída pelo peso dos olhos que a lua tentava manter acesos.
Antes do cair do pano, a Rita fez um último pedido: posso agarrar a lua? Foi-lhe respondido que sim, claro que podia! Em jeito de despedida elevou os braços na direcção da luz e disse: já está!
Com a lua entre as mãos, finalmente adormeceu.