A ESTIBA
O pescador Carlos Nicolau Jaques, referido no texto anterior e também conhecido por Carlos “pão e metade” viveu com a família durante muito tempo num antigo edifício, que teria sido alojamento de trabalhadores duma eventual fábrica de transformação e conservação de pescado, ao tempo já inexistente, e situada em local adjacente.
Era uma casa com um enorme pé direito e acentuada degradação, circundada pelas águas da ria, e a que as marés vivas se chegavam marulhando nela os versos da nortada.
Como parte dum conjunto de outros edifícios já então totalmente arruinados, o local era conhecido por estiba, e a designação pode ter relação com a actividade aí desenvolvida. O trabalho efectuado teve certamente a ver com a conservação de pescado para consumo posterior, e, pelo nome por que se tornou conhecido e foi passado ao longo de gerações, pode ter envolvido o ancestral método de perservar pela salga que a civilização romana deixou bem evidente ao longo da costa, nos inúmeros tanques utilizados para o efeito, e que, não muito longe deste local ainda existem.
Esse método ainda perdura nos nossos dias, é relativamente fácil de executar, e como desafio para os que gostam de experiências novas, passo a descrever:
A estiba de biqueirões é um processo de tratamento desses peixes azulados para posterior consumo, ainda usado por algumas pessoas e que envolve a sua acomodação num recipiente, (lata), em camadas e abundante salga, rematada com a colocação dum peso sobre eles. Cozinham nessa substancial moira, até que experiente avaliação o ache concluído. É um processo demorado, que decorre por alguns meses, e dá origem a um pitéu muito apreciado que se obtém após a sua cuidada preparação. Conservam-se em azeite depois desse procedimento, e são consumidos acompanhados por alho fatiado.
Por tudo o que foi dito, é bem possível, que nesse conjunto de edifícios de razoável dimensão a que chamaram estiba, se tenha desenvolvido um processo de salga industrial para conservação de pescado, semelhante a este.
Nas fotografias que junto, a primeira identifica ao fundo a suposta casa para alojamento de pessoal, ainda de pé, e o espaço da provável fábrica já totalmente arruinado; a outra, ao que parece, retrata a fachada do que seria o edifício das ruínas em altura de laboração e o cais onde supostamente se efectuava a descarga do pescado, totalmente preenchido pelos barcos da época.